LIMITES AO PODER DE REFORMA
Diferentemente do
que ocorre com o Poder Constituinte Originário, não existe duvidas doutrinárias
quanto a pertinência de cláusulas limitativas do exercício do Poder Reformador,
uma vez que o mesmo é um poder instituído, portanto, está sujeito a limitações
de forma e de conteúdo.
O Direito positivo
contém varias espécies de limitação ao Poder Constituinte de reforma, todos
eles previstos pelo próprio ordenamento e podem ser distinguidos por diversas
categorias, tendo por base a via de penetração no sistema constitucional.
Uma primeira
categoria é dos limites internos, também chamados de endógenos ou autônomos,
que provém da própria constituição e que estabelece limites instransponíveis à
derivação constituinte.
Esses limites se
subdividem-se em limites processuais e limites materiais (também chamados de
limites substanciais) , os primeiros são aqueles, cujo próprio nome indica, que
se referem a precaução adjetiva ou tramitação que se deve cumprir quanto ao
procedimento de reforma, já os segundos se referem as limitações de conteúdo material
freqüentemente conhecido como “cláusulas pétreas”, já que contem a parte
proibida da reforma.
Já os limites
exógenos ou heterônomos, podem ser os pactos federais que conduzem a uma
limitação do órgão constituinte enquanto a forma de estado que visa
estabelecer, a supremacia federal que impõe limite ao Poder Constituinte
decorrente e os tratados internacionais, quer em tempo de guerra ou em tempo de
paz (VANOSSI apud LOPES, 1993, p.141).
Estes limites
impostos pelo Poder Constituinte Originário ao poder de reforma, visa evitar a
ruptura da ordem jurídica do Estado e todas as suas limitações devem embutir-se
de idêntico espírito.
Analisaremos a
seguir os limites à competência reformadora.
Limites temporais
A regra geral é
que as constituições podem ser modificadas a qualquer tempo, bastando apenas
ambiente político favorável. No entanto, existem casos em que a constituição só
admite alteração após certo tempo de sua promulgação ou de tempos em tempos.
Isso se dá, para consolidar a “ordem jurídica e política recém-estabelecida,
cujas instituições, ainda expostas à contestação, carecem de raiz na tradição
ou de base no assentimento dos governados” (BONAVIDES, 2001, p.176).
Outra modalidade é
a que determina uma reforma constitucional a um certo tempo de vigência (termo
certo ou relativamente certo), bem como a que estabelece a periodicidade das
modificações como por exemplo de dez em dez anos.
O que importa
considerar de mais relevante nesse ponto é a natureza materialmente
imodificável dessas normas de cunho temporal, cujo bem explica Lopes (1993,
p.143):
“Acreditamos que
todas essas normas de limitação temporal da revisão constitucional, sejam
permanentes ou transitórias, não podem ser afastadas através de reforma da
Constituição, porque, do contrario, ter-se-ia conferido ao Poder reformador a
faculdade de liberta-se das condições de tempo do seu exercício, impostas pelo
legislador constituinte.”
As proibições de
ordem temporal estabelecem um período de fixidez da Constituição que não pode
ser abolido ou encurtado pelo Poder Reformador, diferentemente do que ocorre
quanto ao inverso, ou seja, quanto a possibilidade de se prever ou estender o
prazo de irreformabilidade da Constituição, pois, em tal hipótese estaria o
Poder reformador criando ou tornando mais rigorosas as condições de tempo para
o seu exercício pactuando com o objetivo de eternidade da norma constitucional.
Limites formais
Trata-se de
limites referente ao tramite a ser adotado pelo órgão incumbido de fazer a
reforma, ou seja, os limites formais especificam a tramitação procedimental de
propostas de reforma ou de revisão, como, por exemplo, circunstancias
especiais, espécie de maioria, quórum de votação, casas legislativas.
Limites circunstanciais
São as limitações
impostas para estabelecer os limites de segurança quanto ao momento de reforma
do texto constitucional em razão de algumas circunstancias especiais presentes
no Estado quando da tramitação do processo de revisão. Os limites
circunstanciais existem para vetar qualquer reforma em situações de crise
institucional, em razão do ambiente em que se instaura nesses momentos
impróprios como em estado de guerra, de sitio ou qualquer outra situação que
possa calar a opinião pública ou limitar outros direitos individuais, bem como
a modificação constitucional quando o território nacional esta em todo ou em
parte ocupado por tropas estrangeiras.
Limites Materiais
Os limites
materiais tem a ver com o objeto da reforma. A Constituição prevê certas
matérias que são imutáveis e não podem sofrer alteração, assim, os órgãos com
competência para a reforma ficam impedidos de sobre elas deliberar. Se tornam
imutáveis, não podendo sofrer qualquer tipo de alteração., são as chamadas
clausulas pétreas.
No Brasil, desde a
Constituição de 1891 tem sido estabelecidas limitações materiais ao poder de
reforma. Na Atual Constituição, as limitações materiais encontram-se no artigo
60, §4.º, segundo o qual não poderá ser objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto,
universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias
individuais.
Limites materiais explícitos e implícitos
Os limites
materiais explícitos são aqueles contidos em cláusulas da Constituição que
limitam a competência do poder revisor ou reformador. Essas cláusulas, quanto
ao alcance, podem ser gerais ou individualizadoras de certos princípios, e,
quanto ao objeto podem abranger toda e qualquer matéria constitucional. Os
limites materiais explícitos são as chamadas cláusulas pétreas anteriormente
estudadas, já os limites materiais implícitos são aqueles contidos e
identificados ao longo do texto constitucional, decorrentes dos princípios, do
regime, da forma de governo adotados. Para Bonavides (2001, p.178) tais limitações
“ são basicamente aquelas que se referem a extensão da reforma, á modificação
do processo mesmo de revisão e a uma eventual substituição do poder
constituinte derivado pelo poder constituinte originário.”
Silva (2009, p.68)
demonstra-as, com base em Nelson de Souza Sampaio, são elas:
“- as
concernentes ao titular do poder constituinte, pois uma reforma constitucional
não pode mudar o titular do poder que cria o próprio poder reformador;
- as referentes
ao titular do poder reformador, pois seria despautério que o legislador
ordinário estabelecesse novo titular de um poder derivado só da vontade do
constituinte originário;
- as relativas
ao processo da própria emenda, distinguindo-se quanto à natureza da reforma,
para admiti-la quando se tratar de tornar mais difícil seu processo, não
aceitando quando vise atenuá-lo.”
. Cláusulas
pétreas
O constituinte
originário estabelece para defesa de sua obra cláusulas de irreformabilidade
total ou parcial da Constituição. BASTOS (2000, p.35), nos ensina que “[...]
limitações de fundo ou materiais, fenômeno que dá lugar ás chamadas ‘cláusulas
pétreas’, ‘intocáveis’, ‘irreformáveis’ ou ‘eternas’.”
As cláusulas
pétreas são limites fixados ao conteúdo ou substância de uma reforma
constitucional e que operam como verdadeira limitação ao exercício do poder
constituinte reformador. Elas traduzem um esforço do constituinte para
assegurar a integridade da Constituição, impedindo que eventuais reformas
provoquem a destruição, o enfraquecimento ou impliquem profunda mudanças de
identidade.
Mendes, Coelho e
Branco (2008, p.218-219), destacam que:
“O significado
último das clausulas pétreas esta em prevenir um processo de erosão da
Constituição. A cláusula pétrea não existe tão-só para remediar situação de
destruição da Carta, mas tem a missão de inibir a mera tentativa de abolir o
seu projeto básico. Pretende-se evitar que a sedução e de apelos próprios de
certo momento político destrua um projeto duradouro.”
A fixação de
cláusulas pétreas é comum nas Constituições rígidas e nada mais faz senão
adjetivar a rigidez constitucional, conferindo-lhe uma técnica ideológica da
qual não se desvincula durante toda a permanência na vida do Estado, exatamente
por isso, que a maioria das clausulas pétreas guardam relação direta com a
irreversibilidade da forma de governo, inalterabilidade dos princípios
fundamentais da Constituição e inderrogabilidade da declaração de direitos.
O objetivo maior
das clausulas pétreas não é proteger a redação de uma norma constitucional, mas
evitar a ruptura com princípios e estruturas essenciais à Constituição, sendo
essas estruturas essenciais que se encontram ao abrigo de imutabilidade pelo
poder reformador.
Assim, a cláusula
pétrea protege os princípios constitucionais modelados na norma e não a norma
em si.
Na Constituição
Brasileira de 1988, as cláusulas pétreas encontram-se no rol do artigo 60,
§4.º.
. A COMPETÊNCIA
REFORMADORA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988.
A constituição
brasileira prevê em seu texto duas formas de se realizar a competência reformadora,
ou o poder reformador. A primeira delas é a Emenda Constitucional prevista no
artigo 60, da Magna Carta de 1988. A segunda encontra-se descrita no artigo 3.º
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com o nome de Revisão.
Limites procedimentais
(formais) da Emenda e da Revisão
Os limites formais
também chamados de procedimentais devem obedecer aos seguintes preceitos:
a) Iniciativa do
Presidente da República ou a um terço, no mínimo, de Deputados Federais ou um
terço de senadores, ou ainda, por mais de metade das Assembléias Legislativas
estaduais.
b) a proposta deve
ser discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos de
votação, discutida e aprovada em um turno volta a ser discutida e votada em
outro, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos
dos respectivos membros.
Temer (2008,
p.37), leciona que “este procedimento deve ser rigorosamente obedecido sob pena
de inconstitucionalidade em razão de desobediência à forma.”
Após votada e
aprovada a emenda é promulgada pelo Congresso Nacional e recebe um numero,
cumpre salientar que não há sanção presidencial nem veto.
Ainda importante
ressaltar que quando a proposta houver sido rejeitada ou havida por
prejudicada, não poderá ser ela renovada na mesma sessão legislativa.
No tocante a
revisão, o art.3.º do Ato das Disposições Constitucionais transitórias previa
um procedimento diferenciado para a alteração da constituição, que
iniciar-se-ia após cinco anos , contados da promulgação da Constituição, pelo
voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão
unicameral. Assim, em 1993, a revisão constitucional foi feita, encerrando-se
com a promulgação de seis emendas constitucionais de revisão em 07 de junho de
1994, dessa forma, inadmissível, no Brasil, o procedimento de revisão.
Assim, a nossa
Constituição somente poderá ser alterada por meio de Emendas Constitucionais.
Limites circunstanciais
A Constituição
Federal de 1988, no artigo 60, §1.º dispõe sobre a proibição de tramitação de
emendas constitucionais na vigência de intervenção federal, estado de defesa ou
de estado de sitio, visando garantir a tranqüilidade social.
. Limites
temporais
No que se refere a
revisão constitucional, já extinta em nosso país, previa que o limite temporal
para que a mesma corresse seria de cinco anos, a contar da data da publicação
da Carta de 1988. Assim, poderia o poder de reforma, apenas ampliar esse tempo,
mas jamais reduzi-lo. Como visto, os limites temporais foram devidamente
observado, pois foi feita a revisão constitucional em 1993, resultando na
edição de seis emendas constitucionais revisoras.
No tocante as
Emendas Constitucionais em nosso país não há limites temporais, podendo ser
editadas a qualquer tempo.
Limites materiais: Cláusulas pétreas
Dispõe o artigo
60, §4, da Constituição Federal que:
“Não será
objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I- a forma
federativa de Estado;
II- o voto
direto, secreto, universal e periódico;
III- a
separação dos poderes;
IV- os direitos
e garantias individuais.”
Primeiramente,
devemos ter em mente que o supracitado artigo impede a deliberação de proposta
de emenda tendente a abolir determinados princípios, o que significa dizer que
a proibição visa impedir a extinção de determinados pontos dos incisos
supramencionados, visando a preservação de certos princípios, quais sejam:
a) Forma
federativa do Estado
Não poderá ser
objeto de emenda uma proposta tendente a abolir a forma federativa de Estado,
ou seja, o modo de ser federal do Estado Brasileiro criado pela Constituição de
1988. Essa proibição desde a Constituição de 1891 está presente no direito
pátrio, com exceção apenas do período teoricamente vigente da Constituição de
1937, vedando a transformação do Estado brasileiro em Estado Unitário.
b) Voto direto,
secreto, universal e periódico
A escolha de
representantes políticos diretamente pelo povo está assegurada, impedindo
eleições indiretas. O constituinte também garantiu o voto secreto, entendido
como elemento fundamental do sistema democrático e cristalizou o universo dos
indivíduos que entendeu aptos a participarem do processo eleitoral. Já a
periodicidade dos mandatos é a conseqüência da característica periódica do
voto, não autorizando qualquer modificação nos cargos políticos que o
constituinte previu como suscetíveis de eleição em hereditários ou vitalício.
Essa cláusula
pétrea do sufrágio universal, direto, secreto e periódico é a expressão do
princípio democrático. Não estava prevista no direito brasileiro anterior.
c) a separação
dos poderes
Consagra-se como
necessário e insuprimíveis quaisquer dos três poderes do Estado brasileiro, ou
seja, o poder executivo, legislativo e o judiciário, “reservando-se em favor de
cada poder as atribuições inerentes à sua função básica”(FERREIRA FILHO, 2009,
p.96). Assim, a emenda que suprima, restrinja a independência de qualquer dos
poderes como previsto pelo constituinte originário seria imprópria.
d) os direitos
e garantias individuais
No tocante aos
direitos e garantias individuais, mudanças que minimizem a sua proteção não são
admissíveis. Não se permite através desta cláusula que o constituinte
reformador suprima o rol das liberdades públicas.
“Esses direitos e
garantias individuais protegidos são os enumerados no art. 5.º da Constituição
e em outros dispositivos da Carta.”(MENDES, COELHO e BRANCO, 2008, p.224).
Para a doutrina,
existe polêmica, quanto a extensão dos direitos e garantias individuais
abrangidos pela cláusula pétrea.
Ferreira Filho(
2009, p.97-98) nos ensina que:
“Em primeiro lugar
ao pé da letra, o texto, cuja óbvia intenção é proteger os direitos
fundamentais, exclui da garantia os direitos sociais (e nem se fale dos
direitos de solidariedade). Parece isto absurdo. Porque proteger uma espécie de
direitos fundamentais mais do que outra? Assim, deve-se entender que o
legislador disse menos do que queria e, portanto, os direitos sociais estão
incluídos na proibição. Afinal, na interpretação – já ensinavam os romanos- há
de prevalecer o espírito, não a letra”.
Para nós, os
direitos e garantias fundamentais, abrangidos pela cláusula pétrea, seriam além
dos limites do art. 5.º abrangendo os direitos sociais descrito na Constituição
Federal, do artigo 6.º ao 11 da CF, além de outros direitos previsto em toda
Carta de 1988.
CONCLUSÃO
O poder
constituinte reformador, ou a competência reformadora caracteriza pela
possibilidade de alteração do texto constitucional, função exercida pelos
órgãos de caráter representativo, no Brasil, pelo Congresso Nacional,
respeitando a regulamentação imposta pelo Poder constituinte originário que o
criou.
São comuns nas
Constituições rígidas, que estabelecem o procedimento e o órgão competente para
exercitar o poder de reforma, fixando-se os limites procedimentais, também
chamado de formais, relacionados diretamente com a iniciativa, a competência,
forma, quorum de votação, objetivando um processo de alteração solene e mais
difícil que o processo legislativo comum. Existem também limites circunstancias
que consistem em vedar a alteração constitucional em situações anormais e as
limitações materiais explicitas e implícitas.
As primeiras
denominadas de cláusulas pétreas são limitações impostas pelo constituinte
originário no próprio texto constitucional, esse núcleo é imodificável,
intocável pelo poder reformador, vedando toda e qualquer alteração do objeto e
conteúdo selecionado pelo poder originário, isolando de qualquer alteração
ulterior, normalmente a matéria tratada como clausula pétrea diz respeito a
assuntos estruturais do Estado e das liberdades públicas.
Há também os
limites implícitos no decorrer de todo o texto constitucional que também não
podem ser alterados, apesar de não estarem previstas de forma clara,
subentende-se que não seria passível de alteração por usurpar a idéia e a
vontade do poder constituinte originário.
Em nosso país a
Constituição previu dois tipos de alteração do texto constitucional, a emenda e
a revisão, sendo que esta ultima esgotou-se após sua realização, ocorrida
depois do lapso temporal de cinco anos após a promulgação da Carta de 1988.
No plano formal o
constituinte e livre para eleger suas metas prioritárias na defesa da
constituição e as clausulas limitativas não devem engessar o desenvolvimento
político do Estado. Por outro lado, a finalidade original da rigidez, das
normas limitativas e das clausulas pétreas da Constituição destinam não somente
impedir a reforma total da constituição como também qualquer modificação dos
elementos de identificação e ideologia do Estado, visando reconhecer que os
valores e as motivações que serviram ao constituinte originário como carga
propulsora de um sentimento de perenidade e não de eternidade, assim, os
valores constitucionais devem ser mantidos, não no plano absoluto, mas com
relativização também dos fatores reformistas.
BOA APRENDIZAGEM!
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